Para qualquer artista carnaval é muito mais que folia. Cantar em cima de trio, com chuva ou com sol, durante as mais de cinco horas de percurso é uma verdadeira maratona vocal. Para aguentar o pique e driblar a poeira, a desidratação, o calor do verão e a fumaça que sai dos caminhões dos trios, é preciso além de muito esforço, dedicação e alimentação saudável, favorecer o uso adequado da voz.
Durante o carnaval, é essencial obter rendimento sem prejudicar as cordas vocais. E, não há como manter o mesmo ritmo durante horas sem que haja orientações e treinamentos adequados. “A preparação para o carnaval, na verdade, deve começar muito antes da folia. Todo artista precisa desenvolver a resistência vocal para conhecer o potencial e o limite das suas cordas vocais”, explica a fonoaudióloga Valéria Leal. Há quinze anos, ela acompanha e cria métodos para melhor atender seus inúmeros clientes que participam anualmente da maratona.
A fono assegura que o acompanhamento de um profissional muito antes da folia é de extrema importância. Como as músicas são todas de andamento rápido, por exemplo, o artista precisa ter agilidade vocal. Além disto, ainda há o diálogo excessivo com a percussão e a dança frenética durante longo período, que podem levar ao limite físico do artista. Esse esforço pode causar inflamação e até o aparecimento de lesões como edema, pólipo e hemorragia nas cordas vocais.
O método de tratamento – idealizado por Valéria Leal – permite a conquista de novos hábitos e o restabelecimento do bioequilíbrio, conscientizando o cantor quanto à importância da prática de atividades que proporcionem harmonia do corpo e mente. “Trabalho a resistência e rejuvenescimento da voz”, conta.
Monitoramento – Para o momento da folia, o artista precisa aquecer a musculatura da laringe quando iniciar o show e desaquecer assim que o percurso terminar. De acordo com Valéria, o profissional que acompanhar o artista precisa ter muita atenção para não permitir que o cantor force as cordas vocais ao querer projetar a voz o mais longe possível. “Isso não é preciso. Há em todos os trios equipamentos de amplificação da voz e uso de periféricos com efeitos”, destaca.
Durante o carnaval, o monitoramento vocal dentro do trio conta com a ajuda de análise acústica, conectado à mesa de som. Com a análise dos dados, é possível identificar as freqüências mais alteradas pelo uso intenso, a qualidade da voz durante todo percurso, as características das emissões mais graves ou agudas do cantor. Com base nestes dados, é possível evitar a fadiga vocal, perda da qualidade da voz ou um colapso na voz (afonia) durante a maratona que os cantores enfrentam em cada carnaval.
Curiosidade – A cada hora, um cantor de trio elétrico pode cantar cerca de 20 músicas. Os gritos e emissões em forte intensidade podem estar presentes em quase todas as canções. Valéria ressalta que num percurso de 6 horas durante o carnaval, poderão ser cantadas cerca de 120 músicas, somadas a 120 emissões de voz falada com intensidade aumentada e gritos. Por isso, de acordo com Valéria, todo o ritual é necessário para a sobrevivência da voz. “Cantar no carnaval pode ser mais desgastante do que enfrentar uma ópera”.
Valéria – Há 17 anos Valéria pesquisa, escreve e ensina sobre o comportamento vocal dos cantores de trio, além de monitorar e preparar a voz de artistas consagrados como Daniela Mercury, Margareth Menezes, Carlinhos Brown, Carla Cristina, Alinne Rosa (Cheiro de Amor), Tomate, Márcio Victor (Psirico), Xanddy (Harmonia do Samba), Léo (Parangolé), dentre outros.